O Facebook está fazendo uma viagem muito louca pelo mundo dos pagamentos com blockchain, com um white paper publicado recentemente. Eu tive a oportunidade de conhecer um pouco mais a respeito da moeda e aqui apresento alguns argumentos que me fazem pensar se é, de fato, uma boa ideia investir nessa nova criptomoeda.
Como é um assunto novo e a quantidade de informação ainda é limitada, posso ter tropeçado em algum dado. Se foi o caso, peço que deixe um comentário, aí em baixo, para que eu possa estudar e me atualizar ainda mais.
Ok, o tio Zuck lançou a Libra. Beleza. Agora vamos às perguntas básicas:
O que é e como funciona essa criptomoeda?
Ela é uma “stablecoin”, o que significa que ela está atrelada a algumas moedas já existentes, como dólar e euro, e permite que os usuários comprem e vendam produtos no Facebook Marketplace usando uma carteira digital (não confundir com “virtual”) disponível através de uma aplicação.
O tio Zuck disse que deseja facilitar o envio/recebimento de dinheiro para todos, assim como é fácil compartilhar mensagens instantaneamente. Ou seja, funcionar como o Bitcoin funciona hoje em dia.
Mas o CEO do Facebook disse algo sobre o qual fiquei pensando: nas palavras dele, “é tudo feito com base na Blockchain, é descentralizado, o que significa que é executado por muitas organizações diferentes, em vez de apenas uma, tornando o sistema mais justo.”
Então o “poder” desse sistema será dividido entre alguns validadores para que não exista uma centralização de poder?
Tudo bem… eu poderia argumentar que há uma centralização relativa, pois a Libra tem 27 validadores, somente, enquanto o Bitcoin é bem mais descentralizado, contando com milhares de validadores espalhados ao redor do mundo, com competências distintas (mineradores e nós).
Aliás, já que entrei no assunto Bitcoin, você sabia que o Bitcoin faz uso de uma das maiores redes distribuídas do planeta? Dados completos são públicos para todos os participantes da rede e não há gatekeepers, limitações de validadores ou requisitos para se tornar parte do ecossistema. Cada nó (completo) que opera o software do Bitcoin valida, diretamente, todas as transações do bloco minerado e, indiretamente, todas as transações da rede.
Quando os mineradores fecham um bloco, todo o nó garante que o bloco seja gerado de acordo com as regras de consenso.
Na implementação atual da Libra, os nós validadores escolhidos são quem enriquecem a segurança. A blockchain da Libra está aberto para o público ler, mas fechado para gravações. Isso é ruim? Sim, pois o poder, de fato, é centralizado em torno dessas poucas entidades que se autorregulam, pois o protocolo obedece a ninguém além delas mesmas! É uma ditadura em blockchain. Essas entidades podem congelar suas moedas, roubar suas moedas ou emitir ainda mais moedas. Elas farão isso? Não sei. Elas gostariam de fazer isso? Não sei. Elas têm a capacidade tecnológica para fazer isso? Absolutamente.
A Libra é mais segura que criptomoedas como o Bitcoin, por exemplo?
Vamos lá, a consideração de segurança mais importante que precisa ser dada a uma moeda digital (não confundir com moeda virtual) é evitar gastar a mesma moeda mais de uma vez, gastar o que não é seu ou criar dinheiro do nada. A criação de Satoshi Nakamoto previne isos ao armazenar todas as transações em uma Blockchain que é praticamente imutável após alguns blocos (devido ao algoritmo de prova de trabalho). O suprimento é limitado (21 milhões), as moedas só podem ser geradas pelo processo de mineração (validação), as transações são governadas por criptografia (matemática) e as moedas só podem ser gastas fornecendo uma assinatura válida (que usa criptografia para ficar absolutamente segura).
Já a Libra opera com um consenso LibraBFT — não vale a pena entrar em detalhes técnicos -, que é um modelo confiável desde que 66% da rede sejam “cidadãos de bem”. Portanto, 33% dos integrantes podem se unir e lançar um ataque contra toda a rede com relativa facilidade, dado que a Libra traz um custo muito baixo de execução para esse tipo de ataque. No caso do Bitcoin, é preciso trabalhar com a prova de trabalho por muito tempo para lançar um ataque de 51%, o que torna essa prática difícil, demorada e muito, muito, muito cara.
E na escalabilidade? Quem é melhor?
O Bitcoin foi projetado para que as transações sejam feitas da maneira mais segura possível, o que sacrifica parte da escalabilidade para se obter segurança e descentralização. No entanto, a atual implementação do Lightning Network resolve esse problema e garante que os bitcoins possam ser transferidos de maneira imensamente mais rápida, sem sacrificar mecanismos de segurança.
A Libra, sendo mais centralizada e permissionada, tem maior escalabilidade.É como fazer uma transação através do seu cartão de crédito.
A Libra precisa confiar em alguém?
A confiança é a característica mais importante da Blockchain. A governança do Bitcoin emerge dos usuários através do software que eles executam em seus computadores. Todo o código do Bitcoin é público e você pode verificar parte por parte. Os componentes de governança também envolvem a descentralização e as considerações de segurança mencionadas acima.
Além disso, os desenvolvedores de Bitcoin não têm poderes especiais para fazer com que os usuários mudem para uma nova rede. Mesmo que os desenvolvedores do Bitcoin Core criem uma nova versão do software para criar uma nova rede, os usuários das implementações de software mais antigas poderiam simplesmente ignorar a atualização e continuar usando o protocolo existente como desejarem. Esse é o poder da descentralização: você, leitor, tem poder SEMPRE.
Sendo a Libra uma “stablecoin”, é necessário assegurar que, para cada moeda emitida, saldos de moeda fiduciária sejam mantidos (essa parte está para ser discutida e, talvez, atualizada). Portanto, envolve confiança na organização que irá manter o equilíbrio em moeda fiduciária, confiança no valor da própria moeda fiduciária (se o dólar desvalorizar, por exemplo, você terá problemas) e nos bancos nos quais esse saldo será mantido (essa confiança é perigosa, conforme vimos em diferentes momentos da história da economia global).
Além disso, dada a centralização envolvida na Libra, não há limite em termos do que os validadores acham que o protocolo deva dizer. A maioria desses validadores são empresas da Fortune 500, e eles não estão lá para caridade. Seu principal objetivo/incentivo está em melhorar o valor para o acionista. Você, leitor, NUNCA tem voz.
Eu terei privacidade, pelo menos?
Com a Libra, não. Os revendedores da Libra terão que coletar dados de identificação de usuários sob a recomendação atual do GAFI. Esses dados devem ser transmitidos fora da banda da blockchain. Se alguém traçasse um paralelo, esses dados podem ser usados para identificar recebimentos e gastos de usuários de maneira detalhada. Eu sou um hacker, não um advogado, mas acredito que a Lei Geral de Proteção de Dados pode bater na porta desses revendedores.
Em contrapartida, o Bitcoin fornece pseudo-anonimato. Embora muitas exchanges solicitem KYC ao comprar Bitcoin, o protocolo em si não precisa de nenhuma verificação de identidade, é completamente livre. As carteiras de Bitcoin, adotando práticas simples (como impedir a reutilização de endereços e manter as chaves sob o controle do usuário), vão garantir que sua privacidade seja protegida, em todos os casos.